Esperança e preocupação se misturam, de forma quase
proporcional, ao se falar de ensino e aprendizagem no Ceará: de acordo com
levantamento da ONG Todos pela Educação (TPE), o Estado foi o que mais avançou,
entre 2007 e 2017, na quantidade de estudantes dos 5º e 9º anos que têm nível
adequado de aprendizado em português e matemática. O ensino fundamental
cearense é destaque nacional. É no médio, porém, onde mora a preocupação: em
dez anos, o Ceará subiu apenas uma posição nos índices de ambas as disciplinas.
O estudo é feito com base no desempenho dos estudantes no
Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), e busca acompanhar o
cumprimento da Meta 3 do TPE: "todo aluno com aprendizado adequado ao seu
ano". Os índices consideram tanto escolas privadas como públicas, mas,
segundo a coordenação de projetos do TPE, cerca de 80% das amostras são de
alunos da rede pública. Em Língua Portuguesa, o progresso dos cearenses é
notável. Em 2007, apenas 21,4% dos estudantes do 5º ano tinham aprendizado
adequado para a série, e o Estado ocupava a 15ª posição no País. Já em 2017, o
número saltou para 65,7% (63% se consideradas apenas escolas públicas), aumento
de 44 pontos percentuais, que posiciona o Ceará como o 6º melhor do Brasil. Em
Matemática, o crescimento também foi significativo: em 2007, só 15% tinham
aprendizado proporcional ao 5º ano, quantidade que subiu para 50% (48,3% nas
públicas) em dez anos. O Estado é o 11º melhor nesse indicador.
No 9º ano, último do ensino fundamental, o avanço freia, mas
segue. De 2007 a 2017, o número de alunos com aprendizado adequado em português
cresceu de 14% para 43,6% (40% nas públicas), colocando o Ceará da 16ª para a
10ª posição frente aos demais estados. Em matemática, a evolução foi menor: o
índice subiu de 9% em 2007 para 23% (19,5% nas públicas) em 2017, aumento de 14
pontos percentuais, que posiciona o Estado em 10º do Brasil.
Ao chegar no 3º ano do ensino médio, a educação cearense
segue tendência nacional e estaciona, com evoluções irrisórias em se tratando
de um período longo - o que eleva a preocupação, visto que se trata do último
ano do ensino básico, justamente o que deveria contar com alunos preparados
para ensino superior e mercado de trabalho.
Rede
Em português, apenas 20% dos estudantes do 3º ano médio
tinham nível de aprendizado adequado em 2007, número que em 2017 chegou a 27%
(21,9% na rede pública). O avanço sequer segurou a colocação nacional do
Estado, que caiu do 11º para o 12º lugar no indicador. Já em matemática, a
situação é ainda pior: a diferença de aprendizado em uma década foi de apenas 2
pontos percentuais, passando de 6% para 8% no período. Ainda assim, o Ceará é o
13º neste indicador entre os estados, empatado com a Paraíba.
Conforme a coordenadora de projetos do Todos pela Educação,
Thaiane Pereira, é preciso observar a tendência de regressão dos resultados ao
longo da jornada escolar. Números mais altos no 5º ano caem gradualmente até
atingirem péssimos índices no 3º do médio. E não é à toa. "As razões vêm
desde a alfabetização mal feita, e isso vai se acumulando e se transformando em
defasagem", alerta.
A especialista ressalta, ainda, que as mudanças dos modelos
das escolas têm influência direta. "Até o 5º ano, o aluno geralmente fica
a cargo de um só professor, que o conhece melhor, sabe das necessidades mais de
perto. Depois, isso muda. São mais docentes, menos proximidade. E a escola vai
se tornando menos interessante do ponto de vista de estimular o aluno e dar
oportunidades de escolha", observa.
Apesar do congelamento dos anos finais da educação básica,
Thaiane classifica o Ceará como "exemplo a ser seguido pelo Brasil",
e atribui o crescimento de diversos indicadores à "continuidade" de
políticas como o Programa de Alfabetização na Idade Certa (Paic). "O Ceará
tem uma das piores rendas per capita, mas consegue avançar, porque existe uma
política contínua. O Paic já tem repercussões no 9º ano", define.
A secretária da Educação do Ceará, Eliana Nunes Estrela,
reconhece que "não estamos numa situação confortável" e que "o
ensino médio ainda tem muitas dificuldades", mas espera que a chegada dos
efeitos do Paic, as ações de formação continuada de professores e a ampliação
do ensino em tempo integral contribuam para melhorar os índices. "Focamos
na redução do abandono e no protagonismo estudantil para que eles permaneçam na
escola e concluam a educação básica". Sobre ações focais para melhorar o
aprendizado em matemática, Eliana declarou que "não existem materiais
específicos", mas os professores da rede passam por formações.
Já a titular da Secretaria Municipal de Educação, Dalila
Saldanha, comemora os bons números relativos ao ensino fundamental, mas alerta
para a necessidade de se adotar "novas metodologias de ensino",
sobretudo em matemática. "Temos investido em apoiar os professores, tanto
em formação como em materiais. As ações da rede sempre eram voltadas para
leitura e escrita, mas precisamos mudar para reverter a deficiência em
matemática", aponta. Como iniciativas municipais, Dalila menciona pelo
menos duas formações para docentes da área de exatas previstas ainda para o
primeiro semestre.
Preconceitos
"Na matemática, principalmente, temos que romper com
muitos preconceitos, com aquela cultura de que é difícil. Mostrar que é uma
ciência como as outras e que os estudantes são capazes de aprender. A gente
precisa engajar as pessoas, estimular, fazer com que acreditem que na escola
pública eles podem aprender e evoluir", finaliza Dalila Saldanha.
Fonte: Diário do Nordeste
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