quinta-feira, 21 de maio de 2020

Registros de crimes sexuais contra crianças e adolescentes caem 8,7% no Ceará; subnotificação durante a quarentena preocupa



De janeiro a abril de 2020, 418 crianças e adolescentes foram vítimas de crimes sexuais no Ceará. São, em média, três a quatro ocorrências no estado a cada dia. Conforme levantamento da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), comparado a igual período do ano passado, quando foram 458 casos, o número apresentou redução de 8,7%.

Das vítimas, 241 estão na faixa etária de 0 a 11 anos de idade. As outras 177 são adolescentes.

Historicamente, este é um crime que tende a estar subnotificado. Os atos chegam a acontecer durante anos até que a própria vítima ou alguém perto tenha coragem de denunciar. Por vezes, o fato nunca chega até as autoridades.

Dentre os meses analisados neste ano, abril foi o com menos registros: 67. Conforme Kelly Meneses, coordenadora do Programa Rede Aquarela, que atende crianças e adolescentes e as famílias destas vítimas de abuso ou exploração sexual, em Fortaleza, a queda pode estar diretamente relacionada a este período abranger a quarentena.

Os números de atendimentos registrados pelo Programa Rede Aquarela tiveram redução de quase 50% no último mês de abril. Foram 31 acolhimentos, enquanto a média mensal é de 55.

"Neste período de quarentena sabemos que as crianças e os adolescentes não estão tendo acesso a outros espaços para pedir ajuda. Quando se trata de abuso intrafamiliar a denúncia parte de quem percebe aquela violência. Às vezes percebem na escola ou em um posto de saúde onde a vítima é atendida", diz Kelly Meneses.
Já a SSPDS pontua que a queda durante a quarentena tem como um dos fatores o maior número de pessoas dentro de casa junto às vítimas, dificultando a ocorrência, "uma vez que os abusadores se aproveitam quando estão sozinhos com as vítimas para praticar o crime".

Perfil
O crime de abuso sexual contra crianças e adolescentes está presente em todas as camadas sociais. No entanto, quando ele ocorre na periferia, é revelado com mais facilidade. A coordenadora explica que entre as famílias com melhores condições financeiras é mais forte a questão do temor da opinião alheia: "o que os amigos vão dizer quando souberem?".

Em 2019, na Rede Aquarela, 87% dos acolhimentos foram de vítimas do sexo feminino. "Não é que os meninos não sejam vítimas dessa violência, é porque ainda envolve muito tabu no crime de violência sexual contra meninos. Eles não se percebem como vítimas ou quando percebem, muitas vezes, têm receio de denunciar. O abuso realizado por mulheres mais velhas contra crianças e adolescentes do sexo masculino ainda é muito banalizado. Entre eles é visto como uma conquista", analisa Kelly Meneses.

Ações
A Secretaria destaca a importância de denunciar o agressor à Polícia. Os familiares de uma criança ou adolescente vítima podem se dirigir até a sede da Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente (Dececa), na capital.

Conforme a pasta, mesmo durante o período de isolamento social, a delegacia especializada segue funcionando. "A Dececa recebe todo tipo de ocorrência e denúncia que envolva crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual, exploração sexual, maus-tratos e qualquer tipo de violação ao direto dessa parcela da população", disse a SSPDS, em nota.

Na Dececa há atendimento de uma equipe plantonista do Programa Rede Aquarela, composta por uma psicóloga, uma assistente social e uma agente administrativa. Ainda segundo a SSPDS, também há a Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce), que disponibiliza acolhimento humanizado às vítimas de violência sexual e doméstica no Núcleo de Atendimento Especial à Mulher, Criança e Adolescente (Namca), quando encaminhadas para realizarem o exame de corpo de delito.



Por Emanoela Campelo de Melo, G1 CE

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