segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Ensino fundamental: Ceará tem 4º maior recuo do abandono escolar do País em 10 anos


O Ceará vem reduzindo de forma gradual a taxa de abandono escolar entre 2010 e 2019 nos ensinos fundamental e médio. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o estado é o quarto do país que mais recuou o índice de abandono no ensino fundamental, com 75% de queda em 10 anos. No ensino médio, a redução neste período foi de 66%, a quinta mais alta do Brasil.

Como demonstra um estudo do Inep, mais de 8,2 mil estudantes (0,7% do total de matrículas) das redes pública e privada dos anos do fundamental deixaram a escola em 2019. Já no ensino médio, a taxa de abandono no ano passado foi de 3,5%, o equivalente a 12,2 mil alunos.

Isso significa que apenas um aluno do ensino fundamental deixou a escola a cada 150 matrículas realizadas. No ensino médio, a cada 100 matrículas feitas, uma média de três estudantes abandonaram os estudos.

Apesar dos resultados satisfatórios, profissionais da educação temem que neste ano a pandemia tenha impactado a boa trajetória dos números. Especialistas ouvidos pelos G1 apontam que a necessidade de trabalhar, mesmo ainda em idade escolar, o histórico de reprovações, a falta de atratividade nas ações da escola e a violência são alguns dos motivos que fazem crianças e adolescentes abandonarem a escola no Ceará.


Monitoramento

Uma das ações para evitar o abandono escolar anterior à pandemia e que segue em curso em algumas escolas do Ceará é o projeto “diretor de turma”. Timóteo Monte, professor de artes e educação da Escola de Educação Profissional Salaberga Torquato Gomes de Matos, em Maranguape, na Grande Fortaleza, conta que, na iniciativa, um profissional, com o perfil de maior proximidade com a turma e os pais, é escolhido para acompanhar sistematicamente a participação dos alunos.

“Já fazíamos bem antes de acontecer esse problema. Aí veio a pandemia e esse projeto tem sido fundamental”, reforça. Na escola, há 560 estudantes e destes, 10 não conseguem ter acesso às aulas remotas. “No caso desses alunos, as atividades são feitas e a coordenação imprime para eles pagarem e devolverem presencialmente”, acrescenta.

“Nós temos que pensar também na parte holística do aluno. O aluno hoje faltou a prova, a gente vai lá e vê o que aconteceu. Eu, por exemplo, tenho uma aluno de 15 anos que em julho teve um linfoma no tórax. Ficamos em contato por telefone com a mãe. Isso não impede de fazer as atividades. Quando é dia de quimioterapia, ela avisa e a gente espera o tempo dele. Além disso, reservamos sempre os sábados para o aluno que não conseguiu fazer atividade. Dessa forma, não temos registro de abandono escolar”, conta.

Outra situação, explica o professor, é aquela em que o aluno não interage virtualmente. Nesse caso, se for necessário, a equipe da escola vai à residência do estudante. Em um episódio, após a visita, Timóteo descobriu que o aluno não tinha celular próprio e por isso não se comunicava com frequência no grupo da turma. Segundo ele, a busca presencial foi fundamental para adequar a melhor forma de contato.


Ponto crítico

A taxa de abandono nas escolas corresponde ao percentual de alunos da matrícula total que, num dado ano, deixaram de frequentar a escola durante o ano letivo. Já a taxa de evasão diz respeito ao percentual de alunos de um determinado ano letivo, que, no ano seguinte, não se matriculou na escola. Conforme um estudo nacional divulgado, em agosto desde ano, pelo Instituto de Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) no planejamento das redes de ensino para a volta às aulas presenciais um dos pontos mais críticos são as estratégias para evitar tanto o aumento do abandono como o da evasão.

O diretor fundador do Iede, Ernesto Martins Faria, reforça que o cenário de crise econômica tem implicações diretas em uma possível piora dos índices de abandono nos próximos anos. “Quando a gente olha para os jovens, muitos estão buscando alternativas para ajudar suas famílias, como os aplicativos de entrega. Isso, em um cenário de baixa valorização da educação. Outros não têm condições para estudar bem em casa. Têm vários elementos desfavoráveis. Tem situação de alunos que têm acesso e outros que não. A escola precisa estar próxima. Alunos offline precisam do contato com a casa”, afirma.

Além disso, destaca, é fundamental que as redes de ensino se utilizem da estrutura das secretarias de educação para fazerem o contato offline. “Busca ativa não precisa esperar uma volta presencial. Se tem aluno que está sem fazer atividade, não está tendo contato, é importante ir atrás. Usar o carro da prefeitura, usar o transporte escolar para entrar em contato”, reforça Ernesto.

O oficial de projetos do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Rui Aguiar, reitera que a pandemia mostrou em primeiro lugar que as desigualdades sociais afetam a educação de maneira bastante severa. "O empecilho do acesso das crianças ao computador, celular ou acesso a internet, foram decisivos para que as crianças pudessem acompanhar os diversos modelos que foram adotados”. Portanto, conforme Rui, o fator mais importante não foi exatamente o pedagógico, mas econômico e social. “A falta de condições de acesso a computador, internet ou mesmo celular, impediu que muitas crianças pudessem acompanhar (o ensino)”, ressalta.


Desafio maior

No ano passado, o maior gargalo no Ceará foi o abandono no 1º ano do ensino médio em todas as redes (pública e privada). O índice nesta etapa é de 5% do total de matrículas. O secretário executivo do ensino médio e profissional da Secretaria Estadual de Educação (Seduc), Rogers Mendes, garante que o ensino médio continua sendo a etapa mais desafiadora. No estado, argumenta ele, além das ações de busca ativa, a maior efetividade da aprendizagem, com maior potencial pedagógico das escolas em atraírem os alunos e assegurar ensino adequado, são fatores que têm influenciado na queda do abandono ao longo dos 10 anos.

Rogers também destaca a implicação dos obstáculos econômicos na permanência dos alunos na escola. Em relação à pandemia, o representante da Seduc reconhece que “é muito difícil que ela (taxa de abandono) não vá subir um pouco”, mas explica que “não temos ainda com clareza quais os efeitos reais. Estamos tentando todas as estratégias de busca ativa para que o estudante não se desvincule da escola. Esse ensino remoto não estava na nossa cultura e muitas pessoas até se entusiasmaram, mas ele também cansa. Isso também fez com que os estudantes desencantaram um pouco e também estamos avaliando o efeito disso. Até porque só é considerado o abandono quando termina o ano”.


Por Thatiany Nascimento, Lucas Falconery e Isabella Campos, G1 CE


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