quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Pai asfixiou criança que se jogou do primeiro andar para fugir de estupro em Fortaleza; 'Ela sentia que ia morrer', relata mãe


O relato da mãe da criança de 10 anos que se jogou do primeiro andar de casa para fugir do pai, no Bairro Granja Lisboa, em Fortaleza, revela que a filha foi vítima de estupro e passou uma madrugada de pavor tentando fugir da violência do pai, que a “asfixiava” e “subia em cima dela com o joelho”. A criança chegou a gritar pedindo socorro, mas, segundo a mãe, vizinhos acharam que se tratava de uma briga de casal e por isso não chamaram a polícia. O suspeito fugiu após o fato e ainda não foi encontrado.

No início da manhã de domingo (8), a menina de 10 anos pulou do primeiro andar de casa para escapar do pai, de 34 anos, que a acariciou de forma imprópria e a agrediu de diversas formas antes das 6h. Depois disso, a vítima não aguentou e se jogou da varanda, pedindo ajuda na casa de um vizinho, conforme contou a filha à mãe. O vizinho a acolheu e acionou a polícia após os apelos da criança, que afirmava que o pai queria “estuprar” e “matar” ela.

“Pela manhã, ela me falou que umas 5h ela tentou ser amigável com ele, que ele tava transtornado, que concordaria com tudo aquilo que ele tava sugerindo a ela. Ela disse que não ia mais gritar, que ele podia parar de sufocar ela, tapar a boca dela. Então ele foi até a cozinha, nu, e nesse momento que ele foi à cozinha ela disse que sentiu desespero, que achou que ele ia pegar uma arma, alguma coisa pra ‘tentar’ contra a vida dela. Ela disse que não pensou duas vezes antes de se jogar pra baixo. Que o que ela não queria que acontecesse era uma imundice do pai dela tocar ela”, relatou a mãe.

A filha ainda contou à mãe que, enquanto o pai a asfixiava, ela achava que ia morrer.

“Ela já tava se sentindo morta porque quando ele asfixiava ela, ela sentia um desmaio, ela saía de si, ela disse. Ela sentia que ia morrer. Ela ‘papai, para com isso, você vai me matar, eu vou morrer’”, reproduz a mãe.
A criança passava o fim de semana com o pai quinzenalmente depois da separação do casal. A mãe fugiu de casa por causa da violência do suspeito e conseguiu, depois de um acordo informal com ele, o direito de voltar a ver a filha. No domingo, ela estava em casa, no Bairro Bom Jardim, quando foi avisada pela polícia de que a criança estava no Instituto Doutor José Frota (IJF).

“Eu encontrei ela num estado, que assim...eu como mãe, no momento passei mal quase. Mas tive que ser forte, tive que dar assistência à minha filha, mostrar que eu era forte porque ela tava demonstrando um exemplo de fortaleza também. Somos só eu e ela. Eu por ela, ela por mim, como a gente sempre combinou. A gente é muito amiga.”
Apesar de não conseguir dizer as palavras durante a entrevista, a mulher confirma que o homem chegou a acariciar a filha, o que, pela lei, configura estupro de vulnerável.

“Ela me contou que antes do que aconteceu eles assistiram filme juntos, tava tudo bem. Nessa noite do sábado para o domingo, ela disse que o pai dela se encontrava em casa com um amigo que foi deixar eles dois na casa dele. Ela me contou que ele tava muito agitado, que ele ficou nu dentro de casa o tempo inteiro. Que ele começou a...eu não tenho como falar do assunto porque me causa uma dor muito grande. Eu não consigo nem contar, mas é o que vocês já sabem que possa acontecer com uma pessoa que tem uma criança vulnerável em suas mãos”, diz.

Traumas e dores
A criança não teve fraturas com a queda, mas ainda sente dores no corpo. Segundo a mãe, ela não está frequentando a escola por medo do que as pessoas possam falar sobre o assunto, e de que o pai apareça no local.

“A minha filha está muito abalada, ela não consegue ir ao banheiro sozinha, não consegue andar sozinha. Tudo eu tô tendo que ajudar ela, auxiliar ela. Tô dando comida na boca porque ela não tá conseguindo se mover devido à queda. Ela não fraturou nada, mas tá muito dolorida, tomando medicamento pra que amenize. Não tá indo pro colégio porque não tem condições. Ela deseja voltar às aulas, mas tem receio de julgamento, de que o pai dela possa aparecer na porta do colégio pra se vingar”, comenta.

Após a filha se jogar da varanda e pedir ajuda, o pai chegou a ir até a residência do vizinho falar com a menina. Segundo o vizinho e relato da própria filha à mãe, o pai dizia que ela estava o prejudicando com aquela atitude, que ela estaria “só sonhando”.

‘Me senti incapaz de proteger’
Os pais da criança viveram juntos por cerca de seis anos. A mãe afirma que era vítima de violência doméstica com frequência. Mas que não tinha “nenhuma desconfiança do que pudesse acontecer, porque ele aparentava ser um pai excelente”.

“Demonstrava ser carinhoso, se preocupava, inclusive ela tinha um sentimento grande por ele. Ela se preocupava com ele, esperava chegar o final de semana pra que ela pudesse tá com ele. Sempre ele pegava ela na sexta à tarde, ou então depois do colégio, e devolvia no domingo pra que ela fosse pra aula na segunda-feira. Isso tudo com consentimento. Eu consentia por aquela liberdade que ela tinha com ele, por ela nunca ter me falado nada. Ele nunca agrediu ela. Eu confiava plenamente”, afirma.

A mulher tentou ter a guarda da filha pela Justiça, mas não levou o processo à frente após conseguir se entender com o pai e voltar a ficar com a criança.

“Saí de casa porque ele era violento, ele era uma pessoa que sempre manipulava. Ele brigava comigo, me torturava, me batia, mas depois manipulava toda aquela situação e queria tá certo como sempre. Não sei com que consciência eu fazia isso, mas inúmeras vezes eu perdoava, tentava de novo. Ficava imaginando que ele poderia ser um pai pra minha filha, coisa que eu não tive eu queria passar pra minha filha. Ter uma família, uma pessoa que me apoiasse, criar ela. Uma pessoa que eu achei que ele poderia ser”, desabafa.

“Hoje me sinto arrependida de ser uma pessoa que usa o coração e não a razão, porque deixei tudo o que ele fazia comigo passar. Pela minha filha, pelo amor que ela sentia por ele”, considera.
Ela e a família têm medo do homem, que já os ameaçou diversas vezes e, por isso, não procuravam a polícia. Agora ela aguarda resposta da Justiça após solicitar medida protetiva contra o suspeito.

“O caso da minha filha poderia ser outro, igual a esses que acontecem. Minha filha é uma criança indefesa. Eu quero justiça, eu quero que ele seja pego pra eu ter paz novamente.”
O caso está sendo investigado pela Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente. A polícia fez buscar para tentar localizar o suspeito, mas, até as 17h desta quarta-feira, ele ainda não havia sido detido.


Por Cinthia Freitas e Leábem Monteiro, G1 CE

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