terça-feira, 7 de julho de 2020

Número de atendimentos de pré-natal sofre redução no Ceará durante a pandemia



Seja pela falta de médicos disponíveis para realização dos atendimentos ou pelo medo das gestantes de se dirigirem a uma unidade hospitalar durante a pandemia, o número de consultas de pré-natal diminuiu pelo menos 15% no Ceará. De março a junho, os hospitais da rede pública do estado realizaram 3.238 atendimentos de pré-natal. Número menor se comparado com o mesmo período de 2019, quando foram feitas 3.812 consultas (574 atendimentos a mais).

Os dados disponibilizados pela Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) são referentes aos atendimentos feitos no Hospital César Cals, Hospital Geral de Fortaleza (HGF) e no Hospital Regional Norte (Sobral). Outra unidade referência no tratamento de grávidas é a Maternidade-Escola Assis Chateaubriand (Meac), que atende principalmente gestações de risco. De março a junho de 2020, foram 1.701 atendimentos. Nesses meses de 2019, o número foi de 2.377. Isso representa uma queda de 28,4%.

Em âmbito municipal, de acordo com a Secretaria Municipal da Saúde de Fortaleza (SMS), os 113 postos de saúde da Capital realizaram 41.381 consultas de pré-natal no período da pandemia contra 43.205 nos mesmos meses de 2019, registrando uma queda de 4,22% nos atendimentos.

Consequências
Sem a rotina de atendimentos necessários durante a gestação, o acompanhamento da saúde de grávidas e bebês fica comprometido e pode ter consequências graves. De acordo com Sammya Bezerra, médica diretora de Prevenção da Mortalidade Materna da Associação Cearense de Ginecologia e Obstetrícia (Socego), a falta de acompanhamento gerou aumento de abortos espontâneos, óbitos intrauterinos e nascimentos prematuros. A reportagem solicitou os números dessas ocorrências para a Sesa, mas não obteve resposta até a publicação desta matéria.

“A gente teve realmente essa lacuna de atendimentos, tanto por falta de estrutura como por amedrontamento”, afirma a especialista. Ela explica que as patologias obstétricas tiveram aumento “por não serem diagnosticadas no período hábil”.

É por meio de exames orientados a cada trimestre da gravidez que é possível perceber diabetes ou hipertensão gestacional, problemas no crescimento do feto ou pré-eclâmpsia, complicação que pode pôr em risco a vida do bebê e da mãe.

O médico Homero Carvalho, ginecologista e obstetra da Meac, explica que o acompanhamento não pode ser interrompido. “O que a gente pede é pra paciente continuar fazendo o pré-natal. Não podem ficar em casa com medo e deixar o pré-natal ocorrer sem assistência”, enfatiza.

Sammya aponta que, no início da pandemia, foi garantido para gestantes que seria possível ter acompanhamento, mesmo com os outros tipos de consultas eletivas sendo desaconselhadas. “Por mais que a gente, a rede pública, tenha dito pras gestantes que elas continuariam a ter garantido seu direito de atendimento de pré-natal, faltou perna, faltou profissional, faltou estrutura, faltou unidade, porque a pandemia foi mais séria do que se pensava que ia ser”.

A médica dá o exemplo do HGF, que passou a ser unidade de atendimento de pessoas com Covid-19 e não pôde mais receber pacientes eletivos com outras questões de saúde. Além disso, médicos foram realocados ou até mesmo infectados pelo coronavírus, o que impactou no atendimento de postos de saúde, segundo Sammya.

Medo do contágio
Outro fator para a diminuição no número de atendimentos de pré-natal foi o medo do contágio. Sem estudos que expliquem os efeitos do coronavírus em grávidas, as incertezas e angústias, já comuns no período de gestação, foram amplificadas. “A nível de rede privada, as pacientes contaram com a teleconsulta. Quem podia pagar entrou em contato, mas quem não tinha condição acabou que ficou do mesmo jeito [que pacientes da rede pública], sem atendimento”.

A situação de medo pode levar não só a consequências físicas, mas também a sofrimentos psíquicos. “A primeira coisa que o estresse exagerado pode fazer, ainda durante a gravidez, é aumentar o nível de pressão. O segundo ponto é que, também por causa do estresse, pode ter maior propensão a um parto prematuro. E por fim, ele pode gerar maior possibilidade da mulher vir a desenvolver sintomas de depressão no pós-parto”, diz Sammya.

O receio de ir até uma unidade de saúde afetou inclusive gestantes com coronavírus. Elas acabavam procurando atendimento médico apenas quando já estavam com sintomas graves, como dispneia e saturação de oxigênio baixa. A médica afirma que isso contribuiu para o aumento de casos de nascimentos prematuros.


Por Alexia Vieira, G1 CE

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