quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Um açude seco e 100 mil pessoas à espera d'água

Onde hoje se vê uma espécie de praia já foi só água meses atrás. “Aqui era marezona alta. O pessoal andava até de jet ski”, recorda o agricultor Antônio Ilton Gomes de Abreu, 28. Naquele tempo, diferente de agora, não dava para caminhar até o centro do açude e ter só metade do corpo submersa. O Flor do Campo era como um mar no miolo da zona rural de Novo Oriente, distante 397 quilômetros de Fortaleza. Mas o mar virou sertão. E hoje o reservatório - que abastece duas cidades com, ao todo, 100.265 habitantes - tem mais angústia do que água armazenada.

Com apenas 3% da capacidade, o açude tornou-se um depósito de pedregulhos, mato seco e ossadas de peixes. Culpa da pouca chuva dos últimos três anos? Também. “Mas baixou muito mesmo foi quando abriram (as comportas) pra Carnaubal. Passou 45 dias assim”, atesta o agricultor Antônio Filho Neto, 46. Ele acrescenta: “a gente nunca viveu uma seca tão grande como essa. Estamos pedindo a Deus pra dar uma chuva boa.”

A abertura das comportas citadas por seu Antônio Filho ocorreu ano passado. Medida da Companhia de Gestão de Recursos Hídricos do Ceará (Cogerh) para socorrer a população da vizinha Crateús. Foi feita sob protesto popular. “Os padres fizeram um barulho danado. Mas não teve jeito. Aí, a água não tá mais crescendo. Derramaram pro Carnaubal e ficou pra gente só o que não presta”, reclama o aposentado Antônio Alexandre de Pova, 49.

Na verdade, o que restou do Flor do Campo já não serve para tanta coisa. As margens do açude estão espumosas. A água está mais espessa e há dias em que sai da torneira amarelada e com mau cheiro, segundo os moradores de Novo Oriente. “Pra beber, não dá mais não. Só pra labuta de casa e banho. Pra beber, só de cacimbão, poço profundo ou carro-pipa”, revela o pescador Antônio Alexandre Albuquerque, 39. “Esses dias tá é melhor porque começaram a colocar um produto na água. Mas semana passada tava horrível”, disse a dona de uma churrascaria.

Carros-pipa

Ela e tantos outros moradores apelam para carros-pipa. Muitos veículos vêm do Piauí. O balde d’água custa, em média, R$ 2,50. “Tá com quatro meses que compro. Toda semana, eu compro oito baldes só pra beber e cozinhar”, contabiliza seu Antônio Filho Neto. 

Apesar do baixo nível e da água nem sempre apropriada, moradores de Novo Oriente dão conta de que o Flor do Campo abastece também os municípios de Independência e Quiterianópolis. Carros-pipa retiram água do reservatório todo dia. “Está difícil de viver. E vai ficar pior se Deus não mandar um bom inverno. Deu no rádio que o desse ano vai ser menor do que o do ano passado. Mas só Deus quem sabe. A gente tem esperança. A gente viu esse açude aqui cheio e ver assim agora a tristeza é grande”, resume Luciano Ferreira de Pova, 38.

Saiba mais

Diretor operacional da Cogerh, Ricardo Deodato diz não haver possibilidade de o Flor do Campo secar. Mesmo que não chova em Novo Oriente. “A cidade é pequena e não consome nem 50 litros de água por segundo. O Flor do Campo sempre vai atender às necessidades de lá. Sempre. O que tem lá hoje é muita água”, assegura.
 
Segundo a Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA), Crateús e Novo Oriente também terão, até o fim de 2014, 1.041 cisternas de placa e 17 poços profundos. Uma adutora consta na lista de projetos para Crateús, beneficiando 499 famílias.
 
As duas cidades possuem projetos produtivos e contarão com até 16.063 beneficiários do Bolsa Família, 4.512 beneficiários do Bolsa Estiagem, 2.763 beneficiários do Brasil Carinhoso, 1.106 do Milho Ração e 1.741 do Leite Fome Zero, que distribuirá até o fim do ano 52.421 litros de leite.
 
Perfis das duas cidades beneficiadas pelo Flor do Campo:
 
Novo Oriente tem 27.453 habitantes, Produto Interno Bruto (PIB) de R$ 91.016.000, um açude e dista 397 quilômetros de Fortaleza.
 
Crateús tem 72.812 habitantes, PIB Bruno de R$ 315.320.000, um açude e dista 354 quilômetros de Fortaleza.
O POVO Online 

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